Livro de Fulgêncio de Castro sobre Caxambu - 1873
Transcrição do texto original
Colaboração: Pepe
|
Vista parcial do Parque antes da construção do balneário atual |
G U I
A
PARA
UMA VIAGEM ÁS
AGUAS
MEDICINAIS DE CAXAMBU
PROVÍNCIA
DE MINAS GERAIS
Acompanhada
de uma
BREVE NOTÍCIA
Sobre
a povoação
E um
ESBOÇO
HISTÓRICO DAS MESMAS ÁGUAS
Pelo
Coronel
Fulgêncio de Castro
Rio
de Janeiro
Tipografia
de Hipólito José Pinto
Rua
da Quitanda n.31
1873
DEDICADA
À SUA
MAJESTADE
O
IMPERADOR
O SR.
D. PEDRO II
por
seu muito reverente súdito
Joaquim
José Fulgêncio Carlos de Castro
AVISO
PRELIMINAR
O
tenente-coronel João Evangelista de Souza Guerra, residente na cidade de
Baependi, fornece com presteza meios de condução que haja mister a viajante
para ir a Caxambu, ao primeiro aviso que lhe for dirigido. Os preços
estabelecidos, e relativamente os mais cômodos, são os seguintes:
Liteira convenientemente
preparada,
da Boa Vista a
Caxambu................................60$000
Cavalgadura arreada......................................15$000
Animal para carga
.........................................10$000
Corre
por conta do passageiro o sustento dos tangedores e dos animais somente na ida
ou na volta.
Na
estação da Boa Vista pode-se obter esses meios de transporte recorrendo-se ao Sr.Benjamin
Luiz Duprat, morador na fazenda Três Pinheiros à distância de poucos quilômetros.
A retribuição está assim taxada:
Liteira com 2
parelhas para
Conduzir 2 pessoas...................150$000
por viagem.
Dita com 1 aparelho
para
Conduzir 1 pessoa......................100$000 ˝
˝
Banguê para 1
pessoa............... 80$000 ˝
Cavalgadura arreada
.............. 15$000 ˝
“
Animal para
carga.......................10$000 por viagem
Camarada para
acompanhar..... 5$000 ˝
O viajante paga as despesas dos animais
durante a viagem de ida e volta, assim como o aluguel do animal que conduz o
camarada.
* * * * *
VIAGEM
Partindo
da estação central da Estrada de Ferro de D. Pedro II no trem das 6 horas da
manhã, o viajante chega a da Boa Vista (outrora Major Corrêa) a 1 hora e 50
minutos da tarde.
No
hotel da Boa Vista dá-se-lhe refeição, custando o almoço 1$500 e o jantar 2$000
e importando para os criados ou fâmulos o 1° em 1$000 e o 2° em 1$5000.
Quem
pernoitar nessa hospedaria paga mais 1$000.
Vinho,
bebidas espirituosas e artigos de luxo não se compreendem naqueles preços.
O
viajante ao chegar a Boa Vista dispuser sem demora da precisa condução, pode ir
pernoitar no “Palmital” a 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros) despendendo
1$000 por pessoa, 500 réis por criado e 1$000 pela cama. Os animais têm pasto
gratuito.
Deixando
este hotel às 5 horas da manhã pode o viajante ir almoçar no “Engenho da Serra”
a 2 léguas (13 quilômetros
e 200 metros).
Neste
hotel, onde a cozinha é excelente, os preços são iguais aos do precedente, e há
as mesmas acomodações para os viajantes e seus animais.
Nesta
parte da Serra do Picú o frio é intenso e até certo ponto incômodo quando cai
garoa (chuva finíssima e muito fria,
quase sempre acompanhada de vento).
No
terreno adjacente ao hotel foi descoberta uma fonte mineral, cuja natureza e
propriedades acham-se descritas no Anexo I.
Continuando
a viagem depois do conveniente repouso, e
passando pelo arraial de S. José do Picú, onde há três pequenos hotéis, o
principal dos quais é o Midões, e pelo de Capivari, pode o viajante pernoitar
no hotel Rendez-vous des Voyageurs a ½ légua (3 quilômetros e 300 metros) de Capivari,
ou a 4 léguas (26 quilômetros
e 400 metros)
do Engenho da Serra.
Os
preços e acomodações aqui não diferem dos precedentes.
Saindo
deste lugar às 5 horas da manhã subsequente, e passando pelo importante arraial
de Pouso Alto, onde há um bom hotel, e pela povoação do Sengó, o viajante
almoçará no pequeno mas bem asseado e bem servido hotel do Alto da Boa Vista a
3 1/4 léguas (21 quilômetros
e 450 metros)
do ponto de partida, e continuando na jornada 1 hora depois do almoço, chegará
a Caxambu, com 2 ¾ léguas(18 quilômetros e 150 metros) de caminho,
às 4 ou às 5 horas da tarde.
Em
todos os mencionados hotéis a mesa consiste ordinariamente em feijão, ervas,
arroz, carne de porco ou vaca, galinha, ovos, biscoitos de polvinho e pão
(raras vezes).
O
vinho quase sempre de inferior qualidade é caríssimo.
O
milho consumido pelos animais do viajante constitui despesa especial.
Os
animais podem ser recolhidos em estrebarias se a viagem chegar ao pouso a hora,
em que seja possível fazer-se provisão de capim, que pagará a 500 réis por
carga.
ITINERÁRIO Nº 1
Primeiro
dia da Corte pela Estrada da Ferro de D.Pedro II à Estação de Boa Vista e dali
em cavalgadura ao Palmital.
Léguas 2;
Quilômetros: 13
Metros: 200
Segundo
dia do Palmital ao hotel “Rendez-vous des voyageurs”
Léguas: 6;
Quilômetros 39;
Metros: 600.
Terceiro
dia do hotel a Caxambu:
Léguas 6;
Quilômetros 39;
Metros: 600.
Total:
Léguas:14;
Quilômetros: 92:
Metros: 400
Estas
viagens são regulares até para liteira, mas não obstante, podem ser alteradas,
subdividindo-as pelos pontos intermediários de uma à outra pousada, que ficam notadas
precedentemente como pontos de parada para almoço.
No
intuito de facilitar aos viajantes, que não tiverem conhecimento do caminho, a
subdivisão das jornadas, que mais lhes convier, passamos a indicar as povoações
e lugares mais notáveis entre Boa Vista e Caxambu.
Quadro das povoações e lugares mais
notáveis entre a Boa Vista e Caxambu com as respectivas distâncias.
Província do Rio de
Janeiro.
-Da Boa Vista
(Major Corrêa a João Maciel).
Léguas:11/2.
Quilômetros: 9.
Metros: 900.
- De João Maciel ao
Palmital
Léguas: ½
Quilômetros: 3
Metros: 300
- Do Palmital a
Lapa
Léguas: 1/2
Quilômetros: 3
Metros: 300
Limites
- Do Registro do
Picú ao Engenho da Serra
Léguas: 1
Quilômetros: 6
Metros: 600
Província de Minas
Gerais
- Do Engenho da
Serra a João Pinto (*)
- De João Pinto a
São José do Picú
Léguas: 1
Quilômetros: 6
Metros: 600
- De São José do
Picú a Capivari
Léguas: 11/2
Quilômetros: 9
Metros: 900
- De Capivari ao
hotel Rendez-vous
Léguas: 1/3
Quilômetros: 2
Metros: 200
- Do hotel
Rendez-vous a Pouso Alto
Os
viajantes com liteira e bagagem pesada, que tiverem pernoitado na Boa Vista,
poderão regular suas jornadas por este Quadro, devendo porém notar que não
encontrarão pouso nos lugares com (*).
Neste
caso as jornadas mais cômodas e seguras são as constantes do
ITINERÁRIO N° 2
Primeiro dia: de
Boa Vista ao Engenho da Serra:
Léguas:4
Quilômetros: 26
Metros: 400
Segundo dia, do
Engenho da Serra a Pouco Alto:
Léguas: 5
Quilômetros: 33
Terceiro dia. de
Pouso Alto a Caxambu:
Léguas: 5
Quilômetros: 33
Total: Léguas 14
Quilômetros: 92
Metros: 400
Seguindo-se
este itinerário, os pontos mais convenientes para almoço São 1° Palmital; 2°
São José do Picú; 3° Alto da Boa Vista.
Existem
duas barreiras entre a Boa Vista e o Engenho da Serra; a primeira, na raiz da
Serra do Picú (Província de Minas Gerais). Naquela exige-se a taxa de 100rs por
animal de montaria ou carga, incluindo os de liteira e os soltos.
A
estrada desde a Boa Vista até o alto do Picú, não obstante a extensa e íngreme
subida da Serra, presta fácil trânsito, graças ao cuidado de sua conservação pela
administração provincial do Rio de Janeiro. Mas do Registro do Picú em diante
não estará muito longe da verdade quem afirmar que a cada passo nessa descida
abrupta e de cerca de 2 léguas (13 quilômetros e 200 metros) encontra o
viajante verdadeiros precipícios na estação das chuvas.
Segundo
informações de pessoas fidedignas e até empregados fiscais da província de
Minas Gerais, desde 1866 não tem esta estrada recebido o mais insignificante
reparo, embora transitem por ali diariamente dezenas de viajantes e muitas
centenas de animais de toda a espécie.
O
completo abandono desta estrada utilíssima não pode de certo, ser atribuído à
deficiência de fundos nos cofres provinciais de Minas, porquanto consta de
documentos oficiais que no quinquênio decorrido de 1° de julho de 1867 a 30 de junho de 1872 e
nos três primeiros meses (julho a setembro) do exercício de 1872 a 1873 a importância das taxas
arrecadadoras na Recebedoria do Picú atingiu a importância de 624.019$729,
sendo muito superior a 100:000$000 a média de cada um dos mencionados anos.
Não
obstante ser princípio conhecido e aceito que o produto das taxas da barreira
deve ser aplicado principal senão exclusivamente ao melhoramento da estrada
respectiva, a fim de oferecer mais
segurança e cômodo aos viajantes, mais presteza e eficácia às relações
comerciais, contudo, não se tem procedido assim com a de que tratamos, cujo
rendimento é distraído para outras despesas, deixando-se ao sol e à chuva a
conservação de uma das principais artérias, que alimenta a fonte da receita
provincial.
Desde
a povoação denominada João Pinto na
raiz da Serra do Picú (território
Mineiro) a estrada geral, quase plana, atravessando apenas alguns morros de pequena
elevação, oferece fácil, cômodo e até agradável trânsito na estação seca, mas
na época das chuvas a falta quase total de pontes e pontilhões sobre numerosos
ribeirões e córregos que atravessam, torna o trânsito muito difícil senão
perigoso.
Feitos
porem os indispensáveis consertos na Serra do Picú e construídas as pontes
necessárias, esta estrada dará fácil e segura passagem em qualquer estação do
ano, se curar-se eficazmente da sua conservação.
* * * * *
BREVE NOTÍCIA SOBRE
A POVOAÇÃO DE CAXAMBU
Há
em Caxambu quatro hotéis denominados Fonseca,
União, Oliva e Nogueira de Sá: o 1° situado na entrada da povoação, ao sul;
o 2º na extremidade oposta, e os outros nas proximidades das fontes
Em
todos estes hotéis a mesa é abundante e variada e todo o serviço é feito com
regularidade, pagando os hóspedes 3$000 diários e 1$500 por escravo ou fâmulo,
não compreendendo nestes preços vinhos e outras bebidas alcoólicas, luzes pra
os aposentos, e lavagem de roupa, de que na povoação há quem se encarregue com
prontidão e barateza.
O
hotel Fonseca oferece a vantagem de
uma redução de 10%, aos hóspedes, que se demoram por mais de 30 dias.
No
hotel União porém encontram-se as
melhores, mais vastas e arejadas acomodações.
Os
viajantes sem família lucrarão consideravelmente hospedando-se em hotel, porque
as suas despesas limitar-se-ão a 1/3 que teriam de fazer se alugassem casa e
a provessem dos objetos de uso
indispensável.
Contam-se
atualmente no povoado 78 casas cobertas de telha, muitas das quais são vastas e
cômodas. Seu aluguel regula por 4$000 a 5$000 diários, estando todas alfaiadas
com sofás e seis cadeiras de palhinha, dois aparadores para sala, mesa de
jantar, um banco e três marquesas.
As
casas menores são alugadas por 2$000 e 3$000 diários, e são poucas as que
contém mobília.
Estes
aluguéis são cobrados de Maio ao fim de Novembro, quando há maior afluência de
aquáticos (denominação usada na povoação para designar os concorrentes às
águas).
Segundo
informações de pessoas residentes na
povoação e em Baependi, não só os aluguéis das casas como o preço dos gêneros
alimentícios baixam quase à metade a datar de Dezembro ao fim de Abril.
Convém
aqui notar que, estando hoje beneficiadas as fontes minerais de modo que as
enchentes do ribeirão próximo não as invadam, como outrora na estação das
chuvas, é por isso possível o uso das águas em qualquer época do ano. Portanto,
as pessoas da Corte e de outros lugares, onde os calores de Dezembro a Março
são excessivos , e desenvolvem-se epidemias mais ou menos intensas segundo a
influência climatológica, devem procurar o uso das águas neste período, lucrando assim triplamente, pois
evitam o excessivo calor predominante na Corte, com especialidade durante estes
meses, subtraem-se as condições nocivas de uma atmosfera impregnada de
princípios deletérios, e podem realizar
a economia de cerca de 50% da despesa que fariam de Maio a Novembro.
Pessoa
muito competente, não só pela especialidade de seus conhecimentos, mas também
pelo estudo e experiência das águas, é de opinião que longe de perderem alguma parte de sua eficácia na estação
chuvosa, não só conservam toda a sua força, como adquirem maior intensidade na
aproximação de trovoadas, que promovem maior desenvolvimento dos gases.
É
portanto engano supor-se, como quase geralmente sucede, que a melhor quadra do
ano para o uso das águas é a que decorre de Maio a Novembro, porquanto a
residência em Caxambu torna-se incômoda durante os meses de Abril a Agosto, por
isso que o frio é então quase tão insuportável ali quanto o é na Corte o calor de Dezembro a
Março.
Esta
opinião é corroborada pela prática da Europa, onde o verão é considerado como a
época mais conveniente ao uso das águas medicinais.
Luchon, por exemplo, que no verão
apresenta o aspecto de uma cidade muito populosa e cheia de animação, volve no
inverno, senão a um deserto, à insignificância de um lugarejo, que apenas conta
1.500 habitantes.
Há
presentemente em Caxambu, botica bem provida de medicamentos, consultório de
dentista, loja de barbeiro, oficina de selaria, ferrador, agência do correio,
casa de bilhar e outros jogos, padaria e 15 armazéns onde encontram-se todos os gêneros de secos e
molhados e objetos de loja e armarinho, assim como um açougue, onde se talha,
três vezes por semana, excelente carne de vaca, carneiro e porco, a primeira
das quais é vendida a 100 rs, por libra e a 200 rs as duas últimas.
Os
vinhos, a louça e os vidros são caríssimos, uma medida de vinho inferior custa
de 3$200 a 1$000; um copo que vale 500 rs é vendido por 1$200 e 1$500. As meias
garrafas custam 160 e 210 a
280 rs as inteiras. Esta carestia é
motivada, sem dúvida, pela despesa de transporte, e pelo grande consumo, que
tem, destinando-se elas à exportação das águas medicinais.
Pelas
ruas da povoação mercam-se diariamente em tabuleiros saborosos biscoitos de
polvilho, excelentes broinhas de fubá mimoso, pão-de-ló, doces e sequilhos de
várias espécies.
Nos
arredores da povoação, e principalmente a 3 ou 4 léguas de distância, há
abundância de caça, que consiste em veados, pacas, perdizes, codornas, jacus,
pombas, etc.
O
preço regular das aves domésticas, e outros produtos da localidade é o
seguinte:
Galinhas de 640 a 1$000.
Frangos de 210 a 500 rs.
Ovos 240 rs a
dúzia.
Leite (superior) 80
e 100 rs, a garrafa.
Capado de 5 a 6 arrobas 30$000 a 35$000.
A farinha, o arroz, o milho e o feijão
variam de preço segundo o bom ou mau resultado das colheitas. O café e o açúcar
são vendidos por preços elevados.
A
melhor ocasião para fazer-se provisão de aves, farinha arroz, café, ovos,
queijos e certos gêneros é aos domingos, quando são oferecidos à porta por
indivíduos que faz fazendas e situações da circunvizinhança concorrem ao
mercado de Caxambu.
Não
residindo na povoação nenhum médico, os habitantes, no caso de necessidade,
recorrem a Baependi, a ¾ de léguas (4 quilômetros e
950metros) onde reside o ilustrado Sr.Dr. Manoel Joaquim Pereira de Magalhães,
e outros médicos distintos.
Teve
começo em 1871 e foi concluída em 1872, a expensas dos habitantes e dos
aquáticos, uma capela sob a invocação de Nossa Senhora dos Remédios, onde
celebra-se missa aos domingos pelo Revd. Sr. João José Rodrigues, que é
igualmente pago por subscrição anual dos habitantes e dos aquáticos.
Existem
presentemente duas escolas de instrução primária, sendo uma para meninas e
outra para meninos pobres. Ambas foram instituídas pelo Dr. Carlos Theodoro de
Bustamante, que paga os vencimentos dos professores. A primeira destas aulas
foi inaugurada em 16 de Agosto de 1870. A professora é obrigada a matricular e a
ensinar até seis discípulas, vencendo o dispêndio mensal de 20$000, com
liberdade de receber qualquer outras discípulas mediante a retribuição mensal
de 2$500 por alunas, pagos pelos respectivos pais.
A
aula para o sexo masculino entrou em exercício em 4 de Novembro de 1872. É o
professor obrigado a matricular e a ensinar 12 discípulos, vencendo a
gratificação anual de 300$000, podendo usar da faculdade permitida à
professora.
Até
9 de Setembro de 1873 existiam matriculados 50 alunos, alguns dos quais
apresentavam notável adiantamento, sobretudo em caligrafia e leitura.
Conta
hoje a povoação cerca de 170 habitantes, não incluindo os residentes
temporários, e os moradores das circunvizinhanças em não pequeno número.
Como
sê da planta junta, a povoação de
Caxambu é situada em um vale assente pela maior parte, senão na totalidade,
sobre um banco de turfa.
A
situação, posto que contornada por altas montanhas, entre as quais avulta
majestoso o Morro do Caxambu, cuja
elevação é calculada em 200
metros, de graciosa forma cônica, em cujas encostas
cobertas da mais opulenta vegetação crescem inúmeros arbustos que produzem
frutas as mais saborosas e odoríferas, encerra em si as mais encantadoras
paisagens.
Do
alto dessa eminência, alcatifada de flores silvestres das mais lindas e
variegadas cores em grande abundância, o espectador extasiado descortina o
panorama de indescritível beleza que, em todas as direções, abrange a distância
de 6 a 7
léguas.
Dir-se-á
que esta montanha foi colocada ali pela mão do Onipotente, qual sentinela
gigante, para indicar ao viajante longínquo o depósito precioso das águas
maravilhosas que emanam das suas entranhas.
Apresenta
aquela perspectiva tantas e tão fascinadoras cenas aos olhos do espectador
entusiasmado , que é possível imaginar outras, que mais suaves e deleitosas
condições lhe possam infundir.
A
povoação é acessível por dois caminhos formados pela bifurcação da estrada
geral do Picú, que a uma légua (6 quilômetros e 600 metros) mais ou
menos da cidade de Baependi, divide-se em dois ramos, um a estrada geral, que
continua no rumo E, conduz para a cidade, o outro, que em direção oblíqua, vai
diretamente a Caxambu, situado a O de Baependi.
É
por este caminho que ordinariamente entra-se naquela povoação, evitando-se
assim o rodeio de ¾ léguas (4 Quilômetros e 950 metros que se teria
de fazer passando pela estrada de Baependi.
* * * * *
ESBOÇO HISTÓRICO
DAS ÁGUAS MEDICINAIS DE CAXAMBU
Segundo
a tradição corroborada pelo testemunho de anciães respeitáveis, moradores em
Baependi e em Caxambu, data de 1814
a descoberta destas águas por dois campeiros da antiga
fazenda de D. Luiza Francisca de Sampaio.
Andando
em busca de alguns animais fugidos da fazenda, os referidos campeiros foram ter
ocasionalmente ao lugar, onde hoje existem as fontes minerais, e que então era
um vasto e perigoso tremedal literalmente coberto de mata virgem. Convencidos
da impossibilidade de penetrarem mais avante na mata, os dois campeiros
retrocederam do ponto, a que haviam conseguido chegar com trabalho inaudito e
até com perigo de vida; e foi então que na sua passagem notaram que na fralda
da montanha , hoje denominada Morro do
Caxambu,brotava uma pequena fonte, a qual na frase dos mesmos, férrea.
Admirados
de semelhante prodígio, e ao mesmo tempo movidos de curiosidade, provaram a
água, cujo sabor lhes pareceu horrível!
De
volta à fazenda referiram o fato a sua senhora em presença de um naturalista
estrangeiro (se foi em 1814 que um naturalista estrangeiro, por dizer do povo
de Baependi, examinou as águas minerais de Caxambu, esse naturalista deveria ter
sido ou o Barão von Eschwege, ou Langsdorff,
pois que Saint Hilaire, Spix, Martius, príncipe
Maximiliano, Lund e outras suposições neste particular, vieram ao Brasil
depois daquele fato)que ali se achava
hospedado, o qual, tendo-se feito conduzir ao lugar, onde examinou a água,
declarou à proprietária da fazenda que aquela fonte era uma preciosidade
inestimável, por ser água férrea de excelente qualidade a que emanava, e como
tal remédio poderosíssimo contra opilação e outras enfermidades.
Divulgou-se
rapidamente a notícia do precioso achado,
e pouco tempo depois começavam a afluir ao lugar diversas pessoas
opiladas, as quais, tendo obtido resultados prodigiosos do uso interno e externo
das águas, deram-lhes o nome de “Águas do
Caxambu.
Conhecidas
as virtudes medicinais destas águas, desenvolveu-se rapidamente extraordinária
concorrência de doentes, afluindo igualmente de diferentes localidades da
província de S.Paulo crescido o número de morféticos, cuja presença, posto
fossem expulsos pelas autoridades de Baependi pouco tempo depois da sua
chegada, motivou o descrédito das águas e o seu consequente abandono até 1844.
Cumpre notar que, não obstante a vulgarização das numerosas e admiráveis curas,
conseguidas pelo simples uso das águas, reinou até aquele ano a mais completa
ignorância dos verdadeiros pontos da sua nascença.
Em
uma memória, escrita em 1868, afirmou o finado Felício Germano de Oliveira
Mafra ter sido ele quem, após longa série dos mais árduos e perseverantes
trabalhos embaraçados a cada passo não só pelas dificuldades e perigos que
oferecia o vasto e profundo tremedal, que cobria todo o terreno, mas também
pela falta de meios pecuniários, descobriu em fins de 1844 a nascente de uma fonte
gasosa, que desapareceu pouco tempo depois, por ter sido obstruída com grande
quantidade de cascalho, lançado por pessoas malévolas.
Felizmente,
porém, esta perda, por sem dúvida muito sensível, foi compensada pouco depois
com o descobrimento sucessivo de outras fontes minerais, que ele beneficiou,
fazendo algumas obras que, posto fossem insuficientes, defeituosas e em alguns
casos até inconvenientes, em consequência , sem dúvida, de não haver precedido
à sua construção o necessário estado científico, e nem terem sido realizadas
sob uma administração técnica, assim permaneceram até 1867, quando já as águas
eram procuradas por considerável número de enfermos, que para ali afluíam em
busca de alívio a seus sofrimentos, atraídos pela notícia das curas
prodigiosas, que os primeiros concorrentes às águas haviam obtidos.
A
câmara municipal de Baependi, solícita em promover o bem estar dos seus
municípios, e animada dos mais louváveis sentimentos em prol da humanidade,
dirigiu-se em 16 de Outubro de 1856, ao governo provincial informando-o do
aumento progressivo do número de enfermos, que iam pedir às fontes medicinais
lenitivo a seus padecimentos, e enviando-lhe ao mesmo tempo o extrato das
observações, que sobre as águas havia feito o ilustrado Sr. Dr. Manoel Joaquim
Pereira de Magalhães, cujo resultado é o seguinte:
Ácido carbônico
livre, em abundância.
Carbonato de ferro,
em abundância.
Carbonatos
alcalinos.
Nitrato de potassa.
Hidroclorato de
ferro
e talvez
Hidroclorato de
potassa, etc.
Sendo por isso
úteis nas
Cloroses
Acidentes nervosos
Gastralgias
Amenorréias
Astenias
Caquexias
Hidropsias
Engorgitamentos
viscerais
Febres
intermitentes
Escrófulas
Leucorréias
Blenorragias
Assim como contra a
Esterilidade.
Dez anos antes já o finado conselheiro Dr.
Francisco de Paula Conceição havia analisado a fonte de águas férreas, verificando:
§ 1°- 1° Ácido
carbônico em dissolução.
2°-Abundante
quantidade de carbonato
de ferro.
3° Cloridato de
sódio.
§ 2°-1° Ácido
carbônico em dissolução.
2° Pequena quantidade
de cloreto de sódio.
Por essa condição representou também a
referida Câmara sobre a necessidade de serem desapropriados os terrenos
generativos das águas, a fim de se prepararem as comodidades indispensáveis ao
grande número de pessoas, que recorriam normalmente.
A
Assembléia legislativa da província, atendendo a esta requisição, consignou na
lei n°1104, de 16 de Outubro de 1861, art. 23, a quantia de 4:000$000
para a desapropriação dos terrenos adjacentes ao poço.
Em
1866 foi efetuada a desapropriação por ordem do Se. Joaquim José de Santa Anna
que então administrava a província, como seu vice-presidente.
Parece
que ao votarem os fundos para a desapropriação não atendeu-se convenientemente
à comodidade pública, nem cogitou-se do incremento que a localidade teria
necessariamente à vista da variedade e excelência das águas minerais, da
amenidade do clima e da beleza da situação.
A
área compreendida no polígono que representa o terreno desapropriado, além de
não incluir os verdadeiros terrenos generativos das águas minerais (o morro de
Caxambu) mede apenas 181.780
metros quadrados (aproximadamente
99,543 braças quadradas ou equivalente a uma área, mais ou menos, de 0,01 da
légua quadrada), dos quais deduzem-se diversas áreas reservadas (veja a planta
anexa) restando assim um espaço tão acanhado que, sendo o seu perímetro menor
do que o de algumas chácaras particulares, nem a edificação poderá
desenvolver-se nas convenientes proporções, nem os habitantes gozam de certas
comodidades indispensáveis.
A
falta de logradouros públicos, por exemplo, sujeita-os à imposição operosa de 100 rs diários por
animal no único pasto sofrível de propriedade particular, que há na vizinhança
do povoado. Se não receássemos incorrer na pena de temerários, à vista da nossa
incompetência, sustentaríamos que, ao decretar-se a desapropriação dos terrenos
generativos das águas, era de absoluta necessidade atender as circunstâncias
acima especificadas e a outras considerações óbvias, alargando-se a área cujos
limites, nos parece, deveriam ser uma linha tirada da confluência do ribeirão
João Pedro com o do Tavares ou Bengo pela margem esquerda deste até defronte da
praça n° 100, subindo até a porteira C, donde seguiria na direção 154°N para O,
até defrontar com a grota que separa os morros do Caxambu e da Cruz a 185 metros da dita
porteira. Deste ponto subiria pela mesma grota no rumo N.42° para O, a
encontrar com um pequeno córrego que jaz por detrás do morro do Caxambu, e
tomando aí a direção N. E. para S. O., iria encontrar o córrego “Água
comprida”, ou antes se prolongaria 350 metros na mesma direção. Seguiria daqui, no
rumo N.O. para S.E., até o ponto que, na direção S.O. para N.E. fosse
confrontante com a nascente de um pequeno córrego situado entre a velha Fazenda
do Caxambu e a povoação. Deste ponto assim determinado, tomaria esta última
direção até encontrar o ribeirão João Pedro, cuja margem direita acompanharia
até o ponto de partida, abrangendo assim uma área com capacidade para
edificar-se uma cidade regular e cômoda. Mas ousamos crer que, se para competente e mais
autorizada do que a nossa prestar-se a elucidar este ponto, será reparado o
erro, ou antes a imprevidência primitiva, reconsiderando-se os limites atuais,
e removendo-os para os pontos acima indicados, ou para outros, que ofereçam
igual, senão maior soma de vantagens aos habitantes e espaços suficientes para
o incremento da povoação.
Protestam
contra a insignificância da área desapropriada o conhecimento prático das
circunstâncias peculiares da capacidade; o aumento tão rápido quanto notável
realizado nos últimos quatro anos, assim
na população como na edificação, e o futuro brilhante de Caxambu, quando
construir se, senão o já estudado ramal que, partindo da estação de Queluz, na
estrada de ferro D.Pedro II e transpondo a serra do Picú no lugar denominado
“Passa Quatro”, ligue aquela povoação à Corte, ao menos uma boa estrada de rodagem
que preencha o mesmo fim.
Verificada
a desapropriação, e dispondo a Lei mineira n° 1267 (art.13) que o terreno
desapropriado fosse dividido em lotes para serem aforados, o Sr. conselheiro
Joaquim Saldanha Marinho, solícito em promover melhoramento material e o
bem-estar da província, então confiada à sua ilustrada administração, deu
cumprimento a esta Lei, fazendo medir, demarcar e dividir o terreno em lotes de
diversas dimensões, como se vê da planta anexa, e ordenou ao mesmo tempo o
preparo do cálculo indispensável para o aforamento, sob cujas bases determinou
à câmara municipal de Baependi que a ele procedesse.
Aguardando
o plano e a planta do estabelecimento balneário, assim como o respectivo
orçamento de que havia incumbido o engenheiro Horta Barbosa, sem dúvida para
autorizar a construção das obras, deixou aquele conselheiro a administração da
província, na qual foi substituído pelo Sr. Dr. José Machado da Costa, o qual
não menos solícito pelo progresso da província, reiterou em 19 de Novembro do
mesmo ano a ordem anteriormente dada para o levantamento do plano e preparo do
orçamento a fim de construir-se o estabelecimento balneário. Estes trabalhos,
também cometidos ao referido engenheiro, foram por ele apresentados em
Fevereiro de 1868, e serviram de norma à construção do atual edifício
balneário, que contém seis banheiras fornecidas de água gasosa que, sendo
extraída da fonte D Pedro com o auxílio de uma bomba de alta pressão, é levada
por longo encanamento de chumbo ao ferro.
Além
daquele estabelecimento, construíram-se seis pequenos chalets que resguardam igual número de fontes minerais, hoje
beneficiadas de modo que as águas podem ser utilizadas em qualquer estação do
ano.
No
intuito de obstar as invasões do ribeirão Tavares ou Bengo, em cujas margens
está situada a maior parte das fontes, e que as inutilizava na época das
chuvas, foi o mesmo ribeirão canalizado de maneira que as maiores enchentes não
têm podido atingi-las.
As
fontes beneficiadas são hoje conhecidas pelo nomes:
Na margem esquerda
do Ribeirão
1ª Fonte D.Pedro
2ª Fonte D. Thereza
3ª Fonte Duque de Saxe
4ª Fonte D. Leopoldina
Na margem esquerda
5ª Fonte Conde d´Eu
6ª Fonte D. Isabel
Além
destas, existem três fontes minerais que, tendo surgido posteriormente, ainda
não foram beneficiadas.
No
leito do ribeirão Tavares ou Bengo brotam em diferentes pontos jatos de água
muito límpida em forma de bolhas que se desfazem ao chegarem à superfície.
Não
tendo ainda sido examinadas estas águas, ignora-se a sua verdadeira natureza,
havendo apenas a suposição de serem gasosas.
A
90 metros
da povoação no lado esquerdo do caminho da Glória existe em terreno do Dr.
Carlos Theodoro Bustamante, e por ele cedido gratuitamente à província, uma
fonte que se diz ser sulfurosa ou termal, sobre a qual construíram-se duas
banheiras de madeira. Esta fonte, talvez a mais proveitosa, e efetivamente a
mais abundante é de pouca ou nenhuma utilidade, não sé porque a inutilizam as
águas superabundantes, que a falta de esgotos estagnam junto da fonte, como por
estar a descoberto, e ao alcance das vistas dos transeuntes.
A
utilidade das águas desta fonte para banhos não pode ser posta em dúvida, se
são realmente sulfurosas ou termais. Será conveniente proceder-se a uma análise
e se o resultado confirmar a opinião que se forma da sua composição e
propriedades, pô-las em condições de serem utilizadas. Parece que nesse intuito
deve-se antes de tudo, canalizar o ribeirão, cujas águas alagam a área do
terreno onde existe a fonte, e depois construir tanques ou banheiras, de modo,
porém, a não ser preciso elevar a água por meio de bombas, o que agitaria e lhe
faria perder, na opinião de alguns químicos, parte das virtudes terapêuticas,
que por ventura possuam.
Parece
que fora de vantagem assentar as banheiras colocando os fundos em nível
inferior à superfície do terreno onde surgem as águas da fonte, e da maneira
que se encham sem o auxílio de bombas.
Consta-nos
que na Europa, em muitos lugares de águas minerais, assim têm sido dispostas as
banheiras.
Informaram-nos
também que nas águas do Lambari, na Campanha, os poços antigos tinham os fundos
muito inferiores à superfície do terreno circunvizinho, e que a ação
fisiológica de suas águas era maior do que atualmente, depois que se fizeram
obras no pensamento de beneficiá-las, e se construíram banheiras, que se enchem
por meio de bombas.
Parece
racional que no tratamento de águas, e sobretudo das minerais, deva haver a
maior prudência e critério, e segundo lemos algures, a prova que um engenheiro
pode dar de sua perícia, é não perturbar o que foi disposto pela natureza.
Asseguram-nos
que uma fonte do Lambari tem atualmente suas águas menos ricas de princípios
minerais em consequência de se haver pretendido aumentar o seu volume.
Leigos
totalmente em matéria de trabalhos hidrológicos, as idéias que acabamos de
externar, são o resultado do que observamos com interesse, do que lemos e do que
ouvimos de pessoas que consideramos habilitadas para emitir uma opinião, com
especialidade do distinto engenheiro Dr. Alonso Limpo de Abreu, de muita
saudosa memória, o qual, durante sua estada em Caxambu em 1869, examinou
cuidadosamente as fontes e mais obras.
Relevem-se,
pois, as palavras por nós aqui articuladas em assunto, em que, repetimos, somos
inteiramente leigos. Fale porém quem competente é; falem os médicos que por
vezes tem estado naquela localidade, e que por amor da humanidade e da ciência
alguma coisa devem escrever a este respeito.
Segundo
os exames, que nas fontes beneficiadas fez o ilustrado Sr. Barão de Santa
Izabel, em 1868, a
natureza química e as aplicações terapêuticas das águas são:
Fonte D. Pedro –
Água muito gasosa e pouca alcalina nas:
Dispepsias e
sofrimentos crônicos dos intesti-
nos e estômago,
assim como em banhos.
Fonte D. Thereza –
Gasosa, ligeiramente férrea.
Indicada nas:
Obstruções das vísceras.
Opilações.
Cloroses.
Flores brancas.
Falta de regras.
Fonte Duque de Saxe-
Muito sulfurosa e fracamen-
te gasosa. Indicada
nas:
Lesões crônicas do
útero e ovários.
Sofrimentos da
bexiga.
Incômodos
hemorrodários.
Leucorréias.
Perturbação da
menstruação.
Moléstias da pele.
Sífilis.
Fonte D. Leopoldina
– Água magnesiana gasosa.
Indicada nos:
Sofrimentos
crônicos dos intestinos.
Constipação do
ventre com especialidade.
Fonte Conde d´Eu –
Água pouco gasosa e muito
férrea. Indicada
nas:
Anemias.
Opilações antigas.
N.B. Esta água deve
ser tomada em pequenas quantidades por ser muito rica de ferro.
Fonte D. Izabel –
Água pouco gasosa, ligeiramente férrea e sulfurosa. Indicada nos:
Sofrimentos
crônicos do fígado e baço.
Clorose.
Histerismos.
Acidentes nervosos.
À
vista da excelência e da variedade de águas medicinais, reunidas em um
perímetro de poucas braças de extensão, torna-se evidente a prodigalidade com
que a Providência esmerou-se em enriquecer aquela localidade que, sem
exageração, pode ser denominada Tesouro
de saúde. Infelizmente, este tesouro, que em outro país teria sido
aproveitado com avidez logo após o seu descobrimento, e daria nascimento
instantâneo a uma cidade esplêndida e dotada de todas as comodidades
imagináveis, este dom magnífico e completo como são todos os liberalizados pela
mão do Criador, jaz ignorado e desprezado por largos anos.
E
conquanto o governo provincial de Minas já tenha feito alguma coisa em
benefício das águas, e sejam estas procuradas por centenares de enfermos, que
afluem constantemente de diferentes partes do Império, é sobremodo doloroso
confessar que, a continuar o estado de abandono e o desleixo, em que se tem
deixado aquela importantíssima localidade, desaparecerão em breve os
melhoramentos realizados, que custaram à província 27:000$000.
O
edifício balneário ameaça ruína; as banheiras nenhuma utilidade têm prestado,
porque a bomba, que extrai a água da fonte, existe inutilizada desde 1870; as
valas de esgoto das fontes minerais conservaram-se totalmente obstruídas até
1869, quando foram desentupidas, graças unicamente à liberalidade dos
concorrentes às águas, que também fizeram reparar as estradas a expensas suas;
nas proximidades das fontes existe um vasto e profundo tremedal que, a não ser
a excelência do clima, seria um foco de perenes epidemias.
Julgamos
de rigorosa justiça consignar aqui que alguns dos melhoramentos que hoje se
notam na povoação, como sejam abertura e limpeza das ruas e valetas,
arborização, etc., são devidos exclusivamente à generosidade de alguns
concorrentes às águas, e com especialidade, dos Srs. Drs. Caetano Furquim de
Almeida, José Caetano de Almeida e Joaquim José Teixeira Leite, de saudosa
memória.
Este
estado de coisas é devido sem dúvida à falta de meios pecuniários nos cofres da
municipalidade de Baependi, a cujo cargo estão as fontes. A receita municipal,
insignificante como é, não pode por certo comportar as despesas necessárias
para a conservação das fontes e obras, para o aformoseamento e limpeza da
povoação, e para o reparo das estradas.
À
vista deste quadro contristador, mas esboçado com cores infelizmente
verdadeiras, não é da primeira intuição que, sendo hoje fato incontrastável que
as águas minerais são um meio poderoso de curativo em grande número de
moléstias, rebeldes a qualquer outro tratamento, e estando provado até a
evidência não só pela estatística oficial anexa sob n°2, como por centenares de
exemplos, que as águas minerais de Caxambu encerram em si poderosíssimas
virtudes medicinais, não é de primeira intuição, dizemos, que, longe de serem
votadas ao abandono, cumpre que se cure a todo custo do seu melhoramento desde
que tanto interessam à saúde pública?
Foi
em atenção a todas estas circunstâncias, sem dúvida, que o governo provincial
de Minas celebrou, em 8 de Março de 1873, um contrato com Srs. Visconde de Lages, Dr. Antonio
Pereira Pinto e José Manoel Alves Meirelles, para a construção de um novo
estabelecimento balneário, mediante indenização das despesas feitas com o
estabelecimento atual; mas, não será mais conveniente, não será até dever do
governo imperial chamar a si por meio de desapropriação, por incontestável
utilidade pública, a posse daquele estabelecimento e dos terrenos adjacentes,
depois de verificadas as necessárias análises qualitativas e quantitativas das águas, a fim de curar
eficazmente de sua conservação, fazendo erigir um estabelecimento dotado de
todos os melhoramentos aconselhados pela ciência, e que no futuro será mais uma
fonte de receita para o Estado?
A
razão e o bom senso parecem responder afirmativamente; mas não nos julgando
habilitados para discutir a questão, limitamo-nos a aventá-la, bem convencidos
de que os poderes competentes do Estado, reconhecendo a magnitude do assunto, o
resolverão em proveito da saúde pública.
Caxambu,
12 de Setembro de 1873
* * * * *
ANEXO N° 1
Cópia Fiel
Examinando
a fonte de água férrea sulfurosa, existente nesta situação (Engenho da Serra),
reconheci nela o gás ácido Carbônico, parte carbonato de ferro e o ácido
hidrosulfúrico.
O
cheiro dos ovos podres não é muito sensível ao olfato, como acontece com as
águas termais de Caldas; mas ele comunica ao paladar o sabor pronunciado dos
ovos chocos.
Além
disto a presença do ferro torna-se saliente pelo sabor estíptico, que
apresenta, mineralizando-a.
Depositada
por algum tempo, nota-se o desprendimento do ácido carbônico, que fica aderente
ao vaso e, forma de pequenas bolhas, o que igualmente se vê nas águas virtuosas
da Campanha.
Esta
água é de grande proveito nas moléstias uterinas, nas menstruações difíceis,
etc., devem porém ser tomadas com método.
Nas
moléstias do fígado são também preconizadas, sendo igualmente tomadas com
prudência.
Sou
da opinião que convém conservar a fonte no seu estado primitivo. Qualquer
melhoramento pede deteriorá-la.
Em 4 de Dezembro de 1868. Dr. Barboza da Veiga