Programas para jovens e famílias estão em São Lourenço, Caxambu, Cambuquira e Lambari
Voo de balão sobre o Parque das Águas de São Lourenço: roteiro diversificado
A região do Sul de Minas definida pelo governo do Estado como o Circuito das Águas não é mais a mesma. Juntaram-se às estâncias hidrominerais o café, as montanhas e muita aventura. Turistas da terceira idade ainda são maioria, mas começam a dividir espaço com jovens e famílias. Para atenderem e atraírem cada vez mais esse novo público, empreendedores de São Lourenço, Caxambu, Cambuquira, Lambari, Carmo de Minas e Baependi uniram forças para transformar as seis cidades no polo turístico Águas da Mantiqueira - marca que será lançada oficialmente em outubro. Nos últimos anos, tradicionais hotéis inauguraram alas mais modernas e pousadas intimistas abriram suas portas. Nas cafeterias se encontram bebidas com grãos especiais colhidos na região, e nos passeios foram incluídas diversões como balão, parapente, kart, jipe e bicicleta.
É mais um capítulo de uma história antiga. Águas raras, com funções terapêuticas ou relaxantes, eram muito procuradas pela elite brasileira desde os tempos do império. A princesa Isabel, com seu marido, o conde d’Eu, foi para Caxambu em 1868 em busca de tratamento para sua infertilidade. Deu certo. As águas ferruginosas a teriam curado de uma anemia, e, coincidentemente ou não, ela engravidou em seguida. Até mandou erguer ali a Igreja de Santa Isabel da Hungria, que continua sendo uma das atrações da cidade. Outro ponto turístico é a fonte que leva o nome da regente conhecida por assinar a Lei Áurea.
Nas primeiras décadas do século XX, aristocratas, políticos, intelectuais e integrantes da burguesia emergente passavam temporadas nesses municípios. Imponentes hotéis, alguns com seus cassinos, os recebiam normalmente por 21 dias - era o tempo do ciclo de um tratamento de saúde. Além da hospedagem, promoviam requintados bailes e jogatinas. "Até os anos 80, os almoços e jantares daqui eram frequentados apenas por homens de terno e mulheres com vestido de gala", diz Alexandre Moura, gerente do glamouroso e agora repaginado Hotel Glória, em Caxambu, exagerando um pouco. A construção de 1933 abrigou em seus 25 000 metros quadrados um cassino por treze anos. "Era uma verdadeira Las Vegas brasileira."
Os cassinos funcionaram no Brasil até 1946, quando foram proibidos pelo presidente Eurico Gaspar Dutra. Essa medida representou um duro golpe para a economia das cidades. Os progressos da medicina, a popularização dos remédios e o surgimento de novos polos turísticos derrubaram de vez o interesse pela região. Seguiram-se anos de decadência. A reviravolta teve início nos anos 2000. "Foi quando o governo começou a investir para recuperar o patrimônio histórico", afirma Leonardo Couto, diretor de gestão de negócios da Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig), responsável pelas estâncias hidrominerais do Estado. Em 2007, a Nestlé, que adquiriu a marca São Lourenço com a compra da Perrier em 1992, revitalizou o Parque das Águas - o principal cartão-postal da cidade. Em 2010, a Codemig, com investimentos de 10 milhões de reais, concluiu a reforma dos balneários de Caxambu e de Cambuquira. O próximo passo é a aplicação de mais 10 milhões de reais no Cassino do Lago, em Lambari. "É a joia da coroa", diz Couto. A ideia, segundo ele, é transformar a suntuosa edificação, que remete a palácios franceses, no Museu das Águas. "O Circuito, já reconhecidamente consolidado como segmento de bem-estar, passa a contar com novas atrações, como tour pelas fazendas de café, a valorização da gastronomia local e a exploração do ecoturismo", afirma a secretária adjunta de Turismo de Minas Gerais, Silvana Nascimento.
Para aventureiros que desejam explorar a região da Serra da Mantiqueira, o ideal é se hospedar em Caxambu ou São Lourenço. O Hotel Glória, que inaugurou seu spa em julho passado, tem clientes como a atriz Guta Stresser, a Bebel de A Grande Família, e o cantor sertanejo Leonardo. "Aprecio a região, mas prefiro pinga às águas terapêuticas", brinca Leonardo. São Lourenço reúne melhor infra-estrutura comercial e de entretenimento. "Minha família gosta daqui por causa da tranquilidade, mas havíamos deixado de vir devido à falta de atividades para minhas filhas adolescentes", diz o professor da UFMG Hélio Chiarini Garcia. "Agora, há programas para todas as idades." Além dos hotéis com parques aquáticos, encontram-se pousadas como a Vila Chico, do engenheiro e empresário paulista Alexandre Melo. Quatro anos atrás ele trocou, com a sua família, São Paulo por São Lourenço. "Reuni o que vi de mais legal das minhas andanças pelo mundo e investi aqui", afirma. O empreendimento conta com chalés, piscina com rota terapêutica, pesqueiro e restaurante. "Queremos que as Águas da Mantiqueira sejam reconhecidas como região, assim como ocorreu com a Serra Gaúcha", explica Melo, que também é o representante do Convention & Visitors Bureau de São Lourenço. Esse novo arranjo regional, para além das águas, foi conduzido pelo Sebrae-MG. "São muitos atrativos e bem próximos, fazendo com que uma cidade complete a outra, dando uma nova cara ao Circuito das Águas", diz Ticiana Lopes, uma das coordenadoras.
Um dos objetivos é conquistar o turista mineiro, já que paulistas e fluminenses são maioria. É o caso das irmãs Gabriela, de 22 anos, e Marina Pereira, de 20, de São José dos Campos (SP). "A gente vinha aqui quando criança, mas hoje em dia há mais coisas para fazer. Além de continuarmos indo aos parques e tomando os diferentes tipos de água, agora curtimos novos passeios", conta a mais velha, durante uma viagem no Trem das Águas, entre São Lourenço e Soledade de Minas. A maria-fumaça percorre 10 quilômetros de trilhos, margeando o Rio Verde. Os primeiros vagões foram recentemente reformados e receberam confortáveis bancos acolchoados de couro. Entre um apito e outro, há degustação de queijos e vinhos. Ali já foram gravadas cenas de novelas como Cordel Encantado, Chocolate com Pimenta e Gabriela. Há ainda o tipo de turista que participa de congressos realizados nos grandes hotéis da região. A farmacêutica Fabíola Pereira, de 24 anos, e Paulo dos Reis, de 27, de Pouso Alegre, aproveitaram uma brecha para conhecer melhor Caxambu. "Saímos do encontro, pegamos uma charrete e viemos para o teleférico", ela relata. "Já estamos planejando voltar com calma", completa o namorado. O poeta carioca Olavo Bilac (1865-1918), que frequentava Caxambu e redondezas no início do século passado, dizia que naquela região, chamada por ele de pequeno éden, "poucos dias de paz e de encantada conversa com a natureza valiam meses de saúde". Visitantes começam a dar novo sentido a esse tesouro.