UM ATENDIMENTO DO HOSPITAL SANTA LÚCIA E  DO PLANO GAMA DE SAÚDE
Paulo Roberto Guimarães Moreira  *
No  dia 12 de janeiro de 2011 cheguei ao atendimento de emergência do Hospital Santa  Lúcia. Moro no final da asa norte e o Hospital Santa Helena fica próximo, mas a  comida é péssima, de criatividade zero. E o atendimento lembra o INPS: aquele  monte de doentes desesperados esperando uma consulta. Realmente saúde e educação  no Brasil são péssimas, para não dizer um palavrão. Bem, sempre fui bem atendido  no Santa Lúcia. Ela tinha TV à cabo (acho que NET). 
Hospital  tem que ser muito melhor que hotel e infelizmente não é. Hospital é aquele lugar  que você, desesperadamente, vai buscar amor. Porque o que adoece é a falta de  amor, principalmente, de amor próprio. Quem não é uma bênção para os outros não  pode trabalhar num hospital, a começar pelo faxineiro. Quem não sabe rir também  não. Pessoas cansadas também não.
Voltei  ao Santa Lúcia. Que decepção! Um monte de gente sendo atendida por uma só médica  que corre toda para lá e para cá, resolvendo tudo. Médica bonita, ótimo. Agora,  se o profissional não for bonito que seja simpático, amoroso, prestativo,  interessado, que você sinta que ele está, também, do seu lado. A Médica me disse  que era do signo de aquário: aí disse a ela que ela era inteligente também,  porque aquariano burro morre no parto. Mas, ela estava sobrecarregada e por isso  demorava.
Aí  faltou orientação da equipe, que equipe? Tinha equipe? Parecia algo meio  desorganizado. Por isso me mandaram para os Raios-X que demorava 10 minutos a  revelação das chapas para a médica ver. O laudo só no dia seguinte. E depois eu  fui fazer exame de sangue que demorava uma hora para ficar  pronto.
Mas,  ainda viria o pior: o Gama tinha que autorizar minha internação. Foi  diagnosticado pneumonia. Suspeita de insuficiência do coração que se apresentava  aumentado, o que para mim era novidade. Eu estava, há dias, respirando mal e o  sangue estava com baixa oxigenação. Já havia passado 3 h que eu estava no  hospital. Tinha ido ao banheiro, pela última vez às 17 h. Era 1 h quando  solicitamos ao Gama essa permissão. Eram 4 h da manhã quando a permissão saiu.  Ficar 3 h na madrugada esperando uma permissão nas condições que eu me  encontrava é indignante. Eu nem pago o Gama, ele vai à minha conta e saca  religiosamente e na hora que quer a quantia que eles me disseram que eu tinha  que pagar. Nunca esperaram um segundo para eu autorizar. A autorização é  automática. Por que eu tenho que no momento mais crítico de minha vida, quando  corro risco de morte, quando sofro muito de madrugada tenho que esperar como um  pedinte, um esmo léu, como se eu tivesse pedindo um favor? É indignante! É uma  afronta a dignidade humana esse tipo de saúde capitalista selvagem! Não podemos  e não vamos aceitar isso! Vou publicar essa reclamação como uma crônica na  internet e farei sempre isso quando me sentir ultrajado dessa forma e tenho  certeza que haverá resultado.
O  que continua curioso e que não mudou nesses meus 41 anos de experiências e  cadeira de rodas é que as pessoas comuns e, pasmem, muitos profissionais,  perguntam muitas vezes olhando para minha secretária: - É ele que assina ou é  você. Ou seja, continuam nos vendo como pessoas, absolutamente ou relativamente,  incapazes. É um gigantesco absurdo isso no século XXI.
Mas,  o calvário não terminou aí. Antes, quando eu fazia a nebulização, me informaram  que só um acompanhante podia me acompanhar. Mas eu estava em cadeira de rodas,  sou paraplégico há 41 anos, sou pesado e meu amigo me ajudaria se preciso fosse  a passar para a cama, a menina Fátima resolveria outros assuntos. E havia pelo  menos dois clientes acompanhados por mais de uma pessoa. Pedimos permissão para  entrar mais uma pessoa e uma funcionária perguntou: - É para ajudar? Eu respondi  que sim. Logo veio um segurança com aquele bigodinho tipo Cantinflas. Com aquele  corpo de porteiro de boate ou de bordel e depois de inspecionar o ambiente,  policialescamente, disse de forma autoritária: - Só pode ficar um acompanhante.  É estranho que no século XXI um hospital, para onde vão pessoas e famílias  fragilizadas tenham seguranças? Deviam ter outro nome e outra postura. Deviam  ser educados. Em certo ano a polícia de Tóquio deu seis tiros: para cima. Lá a  polícia estuda arte, é preparada para ter a sensibilidade e a inteligência  emocional para resolver, quase todos os problemas, sem uso ou ostentação da  força. Vocês da medicina capitalista têm que tratar o cliente da melhor maneira  possível, o ideal seria amar o cliente, pois é isso que ele quer e precisa. É só  isso que cura, nada mais. Na saída, disse ao segurança que me olhava com ironia  e superioridade (não sei por que, deve ganhar uma merreca para desempenhar  aquele papel infantil de mocinho que se acha): - Olha, amanhã estarei aqui na  ouvidoria para relatar cada detalhe da minha estada aqui. Ironicamente, ele  respondeu: - Boa noite! Já eram quase 6 horas da manhã. 
Mas,  não termina aí. As duas punções que o técnico fez para pegar minha artéria para  ver o nível de oxigênio no sangue foram frustradas. Também a Médica disse que  doía, a funcionária do guichê disse que doía e o técnico disse: - Dói muito. Já  foi difícil ir lá e dar o braço ao técnico, mas terminar a coleta foi  impossíbel. Saí dali e disse: Dra. me interna nem que seja só por um dia. Fui me  internar. Quando cheguei ao terceiro andar, em frente à famosa sala 324, que a  3h 30 m eu já sabia ser o meu quarto, ninguém sabia. Porta fechada. Chamam a  Hotelaria. Volto a esperar. Eu e minha acompanhante entramos em desespero.  Depois de 30 m aparece a hotelaria. Vou para cama ainda discutindo com a  enfermeira que já nos recebeu com cara de brava, se era às 9 h que eu ia fazer o  cateterismo ou alívio da bexiga ou naquele momento? Eu não urinava há mais de 10  h. A contra gosto a enfermeira veio fazer e não conseguiu, até porque quando  fico muito nervoso os isfincteres, interno e externo, da bexiga, se fecham. E  ainda imaginei: - É essa mulher com essa cara e aborrecida comigo que vai fazer  a punção de minha veia para colocar o soro. Não! Vamos embora. Assinei um  documento lá e me mandei para minha casa. Foi o melhor que  fiz
Brasília,  12 de janeiro de 2011
*  Paulo Roberto Guimarães Moreira é Economista e Mestre em Filosofia pela PUC-Rio,  está no 3º semestre se Direito do UniCEUB, deu aulas no ensino superior por 30  anos. Quando ficou paraplégico morou 2 anos e meio na ABBR – Associação  Brasileira Beneficiente de Reabilitação, e passou a conhecer o funcionamento de  um hospital melhor que muitos profissionais que ficam 6 meses fazendo residência  médica.