AVANT SUPERMERCADO - CAXAMBU

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sábado, 20 de outubro de 2012

Documento histórico



Jornal GAZETA DE NOTÍCIAS – Quinta-Feira, 29 de Março de 1877
Texto Compilado por: PEPE


"AS ÁGUAS DE CAXAMBU"

Vista parcial do Parque antes da construção do balneário atual
São incontestáveis e demasiadamente conhecidas as maravilhosas curas que alcançam as aguas minerais sobre enfermidades que muitas vezes e por muito tempo zombam da mais acertada medicina, para que não seja necessário aqui dissertar sobre um assunto, hoje tão vulgarizado, não só entre os homens da ciência, como até entre as classes menos cultas da sociedade.
Ninguém ignora que uma boa parte das pessoas que daqui vão para a Europa, doentes, encaminha-se ás aguas minerais da França, da Bélgica, da Alemanha e Portugal: e quanto custam estas longas viagens, em sacrifício de tempo e de dinheiro, sabem aqueles que lá têm podido ir, e avaliam os que desejam e não podem ir; por isso, é que reputamos merecedora da atenção dos nossos leitores a ligeira notícia que aqui damos das excelentes aguas minerais de Caxambu, do município de Baependi, ao sul de Minas Gerais.
As aguas de Caxambu, ¾ de légua aquém deste ultimo município, estão situadas em uma praça conquistada sobre um pântano, maior que a Praça da Constituição e menor do que a da Aclamação. Consta esse núcleo de sete fontes ou poços , de 7 a 2 metros de profundidade, dos quais seis se acham beneficiados, cobertos e resguardados dos animais: o sétimo bem como três outros, que se encontram a pequena distancia, de recente descoberta, ainda nem sequer foram analisados, por consequência ignora-o ainda também as especialidades de suas aplicações.
As seis fontes beneficiadas são:
1 – Duque de Saxe, sulfurosa-férrea-gasosa.
2- Dona Leopoldina, magnesiana.
3- Dom Pedro, alcalino-gasosa.
4- Dona Tereza, férrea-gasosa.
5- Conde d’Eu, férrea.
6- Dona Isabel, férrea-sulfurosa-gasosa.
Seria longo enumerar, diz o distinto Dr. Manuel Joaquim Pereira de Magalhães, cuja longa pratica e saber se tornaram proverbiais em todo o sul de Minas, os casos de brilhante sucesso que se tem colhido nas aguas de Caxambu.
As hepatites crônicas, gastrites, gastroenterites, esplenites, metrites, metro-ovarites, hipoemia ( opilação ), ingurgitamento de gânglios, mesentéricos e outras enfermidades aqui tem encontrado o seu meio debelante. Vimos com surpresa resolverem-se condilomas hemorroidários, assim como desaparecer uma glicosuria inveterada que havia resistido aos mais acertados tratamentos dirigidos pelos mestres da ciência.
As diversas afecções cutâneas também em muitos casos tem cedido ao emprego da agua Duque de Saxe, embora a nobre comissão(*) química aí não encontrasse traços de ácido sulfídrico. Não queremos por modo algum contrariar os nossos distintos colegas ( mas para isso nos julgamos habilitados ); mas ou porque a pequena quantidade baste, ou porque a coadjuvação de outros princípios contidos n’agua torne capaz para tanto, o fato dá-se e muitos pacientes o podem atestar.
(*) Composta dos Srs. Drs. Ezequiel Corrêa dos Santos, A.J. de Souza Lima, J. B. Ribeiro da Costa, e mandada pelo Sr. Conselheiro João Alfredo, quando ministro em 1875, para analisar todas as aguas minerais da província de Minas.
Com efeito, quem estas linhas escreve, presenciou a cura completa de um dartro que tomava todo o pé direito de uma moça de 18 anos; e afirmaram-me pessoas dignas de todo o conceito que muitas enfermidade de pele tem obtido das aguas Duque de Saxe o mais brilhante resultado.
Para as inflamações de fígado, baço, sofrimentos de estomago as aguas de Caxambu são do mais salutar e eficaz efeito.
O povo ignorante, que dá mais crédito ao maravilhoso absurdo dos curandeiros que ás lúcidas teoria da mais pura ciência, geralmente inclinado, ás panaceias, vê nas aguas de Caxambu uma dessas drogas feitas particularmente para duas dúzias de enfermidade e geralmente para as outras; daí o descredito em que caem frequentemente aquelas fontes, porque não curam tísicas pulmonares, hipertrofias, bernies e até loucura !
Trazem para aqui, disse-nos um sisudo morador do lugar, tísicos em último grau, morféticos e até malucos !
Outros há que querem em oito dias a completa cura da enfermidade que os aflige há anos, e muitos são os que, revoltando-se contra a ação das aguas que lhe exacerba os males, voltam praguejando para os lugares de suas residências, onde, muitas vezes, os surpreendem na benéfica reação que não tiveram paciência bastante para aguardar em Caxambu. Estes e outros fatos tanto têm contribuído para que tão precioso tesouro da saúde seja desdenhado por uns e desconhecido de outros.
As aguas minerais de Caxambu jazem, infelizmente, em completo abandono: a província de Minas, ou antes, aqueles que a governam, nunca cuidaram seriamente dessas preciosas fontes de saúde, que também são para os países que a possuem valiosos recursos da riqueza pública.
É certo que em 1865 a assembleia provincial autorizou alguns melhoramentos que, com efeito, se realizaram: mas, também não é menos certo que todos esses melhoramentos se tornam perdidos se não fora a solicitude de alguns proprietários e negociantes do lugar, pois nenhuma verba foi desde então consignada para a conservação do que se fizera.
Dentre os proprietários benemerentes de Caxambu é digno dos maiores elogios o Sr. Dr. Carlos Fortes de Bustamante, importante fazendeiro do Rio e Minas, que, ás suas custas, tem proporcionado muitos melhoramentos ás fontes e ao povoado.
Também alguns enfermos que ali tem encontrado lenitivo a seus males, tem beneficiado o núcleo daquelas preciosas fontes, e entre os mais generosos cumpre citar-se o ilustrado negociante desta praça, o Sr. Dr. Furquim d’Almeida.
Das obras mandadas fazer pelos cofres provinciais jaz em quase completa ruína uma casa de banhos, com seis banheiros, sala de espera, depósito de agua alcalino-gasosa e bomba de pressão. Este estabelecimento que custou 35:000$ perdeu-se, por falta de conservação; o despregamento de uma parte da coberta de chumbo, introduzindo as chuvas pelas aberturas, tudo apodreceu !
O governo geral chamando a seu domínio as aguas minerais da província de Minas, pareceu querer fazer alguma coisa, mas tudo se limitou a dois privilégios relativos ás aguas de Caldas e Caxambu; os favorecidos desta, até agora nada mais tem feito que não seja procurar quem lhes compre a concessão gratuita por um preço exagerado, impedindo desse modo, que outros façam o que eles nunca farão.
A esse revoltante abandono em que, quer da parte do governo geral quer provincial, estão entregues as agua de Caxambu, acrescente-se o péssimo estado em que estão as estradas que conduzem da província do Rio aquele ponto: em tempos de chuva o transito torna-se quase impossível. No entanto só a província de Minas cobra na barreira do São José do Picú mais de 180:000$ anualmente !
Apesar de todos esses óbices, as aguas de Caxambu atraem de ano para ano maior número de enfermos; no próximo passado, durante a estação de agosto a outubro, a concorrência foi assaz numerosa.
Alguns desafetos ao lugar, por espirito do mal entendido bairrismo, propalam seja Caxambu febrífugo; isso, porém não é exato, quem escreve esta noticia, vitima durante dois anos quase consecutivamente de uma febre intermitente, viu-se completamente livre dela em 20 dias de permanecia aquele salubríssimo lugar.
Caxambu é um povoado pequeno, circundado de uma cadeia de montes cobertos de verdura, o clima é delicioso, as aguas abundantes e as carnes, os legumes, o leite e as frutas são excelentes.
Atualmente acha-se provido de todo o necessário a vila; nada lhe falta para que ali se possa passar bem.
Na cidade de Baependi residem o Sr. Dr. Manuel Joaquim, que acima citamos e seu talentoso filho o Sr. Dr. Cornélio de Magalhães, sempre prontos a qualquer chamado; e mesmo em Caxambu reside o Sr. Dr. A. P. de Meirelles Enout, tão notável pela proficiência como pela sua ilustração e cavalheirismo.
O colégio de instrução primária e secundária dirigido pelo seu proprietário o Sr. Eduardo Rodrigues Vianna, situada em uma bela chácara a pequena distancia das fontes, oferece as melhores disciplinas escolares a par de um clima ameno e aguas minerais, o que quer dizer a saúde e a instrução á idade em que ambas essas coisas devem ser inseparáveis.
Há em Caxambu dois hotéis, sendo o principal o que tem a denominação do povoado, pertencente ao Sr. João Carlos Vieira Ferraz, um cavalheiro amável, que faz a honra á província de Minas, sua terra natal. A casa deste hotel, conquanto não possa competir com as de primeira ordem da Corte, oferece, contudo cômodos asseados, decentemente mobiliados , bem arejados, servidos por criados diligentes e fiéis; a mesa é abundante, variada e bem preparada; os vinhos e outras bebidas alcoólicas são de primeira qualidade.
Além desses hotéis, há umas casinhas que se alugam mobiliadas e prontas, de 80$ a 150$ mensais, conforme a estação e as proporções da casa.
O Sr. Ferraz tem umas casas anexas e em frente ao hotel, onde hospeda as famílias, para estarem em mais liberdade.
Há também em Caxambu uma padaria, corte de carne de vaca, uma farmácia, armarinhos, lojas de fazendas, armazéns de molhados, alfaiate, sapateiro, barbeiro, e também duas casas de recreio, com bilhares, jogos de salão e salas de baile, um desses estabelecimentos pertence ao Sr. Ferraz e está próximo a seu hotel, e outro ao Sr. Double, que também é um excelente dentista.
Os preços dos comestíveis, moradia e demais acessórios são, relativamente, iguais aos da Corte. O hotel do Dr. Ferraz cobra 4$ diárias por pessoa e 1$500 por família, os vinhos á parte; estes custam geralmente 25% sobre os preços da Corte. As galinhas, ovos, carneiros, a carne de vaca são baratissimos, o leite, que é muito superior, ainda mais.
O uso das águas de Caxambu tem duas estações; a primeira de março a maio, é a menos concorrida por estarem as fontes um tanto fracas, o que torna o curativo mais moroso. Esta época é a mais módica em preços para quem aprecia a solidão e entende, talvez com razão, que o bulício e as festas são prejudiciais a um bom tratamento e á melhor estação.
A segunda época é de agosto a outubro, e mesmo até novembro; nesta a afluência é numerosa, as reuniões cotidianas, os bailes e festas frequentes; por consequência, é a mais dispendiosa.
A viagem pela estrada de ferro até a estação da Boa Vista, custa 10$900 por pessoa, em carro de Primeira Classe, dai por diante vai-se a cavalo ou de liteira; qualquer dessas duas ultimas conduções encontram-se naquela estação ou manda-se vir de Caxambu, do hotel do Sr. Ferraz, bastando para isso escrever-lhe com antecedência de oito dias, determinando-lhe a data em que se quer a condução posta na Boa Vista.
Os preços do Sr. Ferraz, que me consta serem os mais módicos são:
Liteira e condutor -          80$000
Animal de carga ou de cela -     15$000
Camarada à cavalo -     20$000
Quer a viagem se faça em dois quer em seis dias, que é o máximo. As despesas pelo caminho, tanto de ida como de volta, são á custa do viajante. Essas despesas, de almoço, jantar, dormida, sustento das  pajens e animais regulam de 10$ a 12$ diários por cada um viajante. Em resumo; um doente que possa ir á cavalo segundo o tirocínio abaixo indicado, sendo o mais razoável, não despende da Corte a Caxambu mais de 110$ a 130$ incluindo a sua bagagem.
O melhor e menos fatigante tirocínio é: - no Primeiro dia, da Corte á estação da Boa Vista; no Segundo dia, da Boa Vista ao Engenho da Serra; no Terceiro dia, do Engenho da Serra a Pouso Alto; no Quarto dia, de Pouso Alto a Caxambu.
Em todos esses pontos e nos intermediários há hotéis, de regular comodidade e excelentes refeições. Além dessas despesas há as contribuições das barreiras, a título de conservação das estradas, que nunca se consertam.
Há também correio para Caxambu, de três em três dias.