Reformulação de uniformes femininos visa a recuperação da autoestima e a qualificação profissional
Júlia* aprendeu com as agulhas um novo ofício e a disciplina. O sonoro ziguezague da máquina de costura a fez tecer o desejo de ter sua própria confecção de roupas um dia e ser motivo de orgulho para a família. Bruna* descobriu, fio a fio, que um trabalho bem-sucedido demanda esforço, dedicação e uma boa equipe. Elas partilham o mesmo panorama atual – cumprem pena no presídio de Caxambu – e fazem parte do time de mulheres que confeccionam os novos uniformes para as detentas de Minas Gerais.
A produção de uma vestimenta exclusivamente feminina é uma iniciativa do Comitê de Política Estadual de Atenção às Mulheres em Situação de Privação de Liberdade e Egressas do Sistema Prisional
do Estado de Minas Gerais (Copeampe). A novidade partiu do entendimento de que os uniformes padronizados para homens e distribuídos para reeducandas em tamanhos pequeno, médio e grande reiteram a cultura que faz vista grossa à dignidade humana, direito de todo ser humano.
O início preciso das produções no presídio de Caxambu, o Dia Internacional da Mulher deste ano, simboliza a recuperação da autoestima das costureiras e das próprias usuárias do novo modelo, que tem bolsos, falso zíper e um corte que valoriza a silhueta e o corpo da mulher.
Para o juiz de Caxambu, Raphael Ferreira Moreira, a reformulação da roupa “respeita
a diversidade de sexo e demonstra maior preocupação do estado com a dignidade das reeducandas”. O magistrado lembra que a maioria das detentas chega ao cárcere sem o conhecimento de qualquer profissão. “Ao saírem iniciadas em uma atividade técnica, como a costura, essas mulheres adquirem a possibilidade de ingressar no mercado de trabalho para garantir o próprio sustento e de suas famílias”, ressalta.
O trabalho prisional reúne benefícios para as reeducandas, que, estimuladas, mostram-se úteis para a sociedade, recuperam a autoestima, adquirem habilidade profissional, fortalecem o caráter e a personalidade, têm ganho financeiro e/ou redução da pena (de acordo com a atividade) e movimentam a economia.
Para substituir definitivamente os trajes atuais no estado, serão fabricadas 26,4 mil camisas, 19,8 mil bermudas e 13,2 mil calças em um ano, conforme expectativa da Secretaria de Estado de Administração Prisional (Seap).
Mão na massa
Em Caxambu, 18 mulheres à frente da iniciativa da Copeampe já fabricaram 7,5 mil bermudas e calças desde março. O modelo de produção consiste na segmentação dos ofícios de corte, costura e acabamento: há quem rebata, pesponte, revise e faça a contagem das peças.
A reformulação da vestimenta estimula o trabalho em equipe, característica fundamental para quem busca um lugar no mercado de trabalho. “No início era apenas uma reeducanda costureira ensinando outras quatro, mas logo as cinco repassaram seus conhecimentos às demais e assim está acontecendo a multiplicação do aprendizado de costura”, relata Deise Macedo, representante do presídio.
Elas também trabalham com limpeza, lavanderia, obras e atendem em salão de beleza, serviço que é oferecido quinzenalmente. As nove reeducandas nessa ocupação têm um dia de pena diminuído a cada três prestados em prol da unidade. Em uma oficina de artesanato, 14 sentenciadas utilizam garrafa PET, retalhos de pano e outros materiais recicláveis. Os parentes comercializam as peças, que se revertem em sustento para elas mesmas e a família.
O presídio de Pouso Alegre contabiliza 11 mil camisetas produzidas, desde que as peças começaram a ser confeccionadas por oito mulheres, em agosto. Dayana Aguiar, diretora de atendimento e ressocialização do presídio, explica que uma reeducanda coordena e distribui a função das outras conforme suas habilidades, antes das peças serem encaminhadas para a estampagem.
A parceria entre a unidade prisional de Pouso Alegre com empresas de ramos variados emprega atualmente 24 mulheres, que atuam em um restaurante e na montagem de artefatos plásticos para a fabricação de garrafas térmicas.
*Os nomes usados na matéria são fictícios para preservar a identidade das reeducandas.
Assessoria de Comunicação Institucional - Ascom
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Fonte: TJMG