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domingo, 8 de maio de 2016

Mulheres relatam experiência como 'mães de coração' no Sul de Minas

Mulheres relatam experiência como 'mães de coração' no Sul de Minas

Após passarem por inúmeros tratamentos, elas adotaram duas crianças.
No primeiro Dia das Mães da vida delas, a alegria de formar uma família.






Daniela AyresDo G1 Sul de Minas

Anos de tratamento médico e a gravidez que nunca veio. Flávia chegou a receber um "alarme falso". Hellen simplesmente se cansou da vida em consultórios. Quem as vê neste domingo (8), no primeiro Dia das Mães no papel da maternidade, não imagina que por um momento elas viram mais distante o sonho de ter filhos. A adoção multiplicou por dois a alegria em família de cada uma.
Flávia e o filho Oliver: descoberta da maternidade com a adoção, Pouso Alegre, Dia das Mães (Foto: Daniela Ayres/ G1)Flávia e o filho Oliver: descoberta da maternidade
com a adoção (Foto: Daniela Ayres/ G1)
Gerando com o coração
Há quase um ano, Kennedy, de 2 anos e 8 meses, e Oliver, de 5 anos, entraram na vida de Flávia Aparecida Rosa Ribeiro, de 34, e do marido, o professor Júlio César Ribeiro, de 37. O telefonema do abrigo chegou no mesmo dia em que o médico disse à monitora de escola que ela poderia estar grávida.
"Na hora do ultrassom, o médico viu que não tinha gravidez. Fiz o exame de sangue e realmente não deu. Eu nem estava mais pensando em ser mãe quando surgiu a possibilidade. Então eu chorei, eu fiquei triste porque, de novo, eu não podia", conta Flávia.
Mas o destino guardava outra surpresa. "De repente, me ligaram dizendo que havia duas crianças para serem adotadas. Foi aquele conflito de sentimentos. Eu posso, não posso, posso, não posso, mas eu queria", sorri. "Como acredito muito na graça de Deus, eu acho que eu estava grávida mesmo, mas gerando aqui no coração."
Era outubro de 2014, quando o casal entrou na fila de adoção. Desde os 22 anos, Flávia se submetia a tratamentos para engravidar e fazia planos de ter uma casa com pelo menos dois filhos gerados por ela e um adotado.
Dificuldade do casal para gerar filhos, agilizou planos de adoção, conta monitora de escola de Pouso Alegre, MG (Foto: Daniela Ayres/ G1)Dificuldade do casal para gerar filhos, agilizou planos de adoção, conta monitora de escola de Pouso Alegre
(Foto: Daniela Ayres/ G1)
"No começo do ano, descobrimos que o Júlio também tinha uma dificuldade para ter filhos e resolvemos entrar no processo de adoção. Até conhecermos o Oliver e o Kennedy foi uma gestação mesmo - nove meses até a ligação do abrigo, em julho", lembra.
Nascidos na região central de Minas Gerais, os irmãos já estavam desvinculados da família e aguardavam a adoção há dois anos. De Pouso Alegre, foram 7h de viagem e o abraço recebido de Oliver foi o sinal de que nasciam ali um pai e uma mãe de coração.
Oliver (acima) mostra coleção de calçados; para Kennedy, cama é seu cantinho especial: dificuldades de vida superadas na nova casa (Foto: Daniela Ayres/ G1)Oliver (acima) mostra coleção de calçados; para Kennedy, cama é seu cantinho especial: dificuldades de vida superadas na nova casa (Foto: Daniela Ayres/ G1)
"Parecia que estavam esperando. Eles conheceram um casal antes da gente e não se abriram para o casal. A hora que a gente chegou, o Oliver pulou no nosso colo que nem um foguete. É como se ele dissesse: 'eram vocês que a gente esperava'", conta.
No dia 3 de fevereiro, a certidão de Oliver e Kennedy com o nome dos pais foi o presente de aniversário de Flávia. "Acho que inverteu, 'né'? Temos dois adotados e quem sabe o que pode acontecer daqui pra frente? Se Deus permitir", brinca.
Neste Dia das Mães, a família está maior na casa de Flávia e Júlio, em Pouso Alegre, MG (Foto: Daniela Ayres/ G1)Neste Dia das Mães, a família está maior na casa de Flávia e Júlio, em Pouso Alegre, MG
(Foto: Daniela Ayres/ G1)
'Eu tenho uma missão'
Já a história da professora Hellen Morais, de 41 anos, e do marido, o psicólogo Rodrigo Fonseca, de 42, se cruzou com a das irmãs Letícia, de 8, e Ana Júlia, de 10, no Carnaval deste ano.
"A gente tinha várias opções de viagens, 10 crianças para conhecer em três regiões do país, mas a gente gostou da história das duas. Foi uma coisa muito estranha. Eu achei que ligariam e que eu ficaria com o coração disparado. Quando a assistente social falou das duas, foi uma energia muito diferente", diz Hellen.
Ana Júlia, Hellen e Letícia: amor de sobra neste domingo (8), Dia das Mães, Pouso Alegre, MG (Foto: Daniela Ayres/ G1)Ana Júlia, Hellen e Letícia: amor de sobra neste domingo (8), Dia das Mães (Foto: Daniela Ayres/ G1)
Em oito anos de casamento, Hellen também tentou engravidar. Assim como Flávia, ela queria vivenciar a gestação e todas as fases das três ou quatro crianças que planejava ter com o marido. A adoção também estava nos planos. Além da experiência vivida por amigos e familiares com os filhos de coração, ela sempre acreditou ter uma missão.
"Em 2014, quando fiz uma reportagem em um abrigo para crianças [ela atuava como jornalista de TV na época], recebi uma carta de uma menina de 7 anos pedindo que eu a levasse comigo", recorda. "Aquilo mexeu muito comigo. Eu pensei: tenho uma missão. Não vai ser com ela, mas eu tenho uma missão."
Juntas desde março, mãe de coração coleciona bilhetes feitos pelas filhas, em Pouso Alegre, MG (Foto: Daniela Ayres/ G1)Juntas desde março, mãe de coração coleciona
bilhetes feitos pelas filhas, em Pouso Alegre, MG
(Foto: Daniela Ayres/ G1)
Em 2013, o casal estava na fila de adoção. Um processo considerado pelos dois muito mais sofrido que os tratamentos a que tinha se submetido e, no entanto, essencial para que tivessem a certeza do caminho que estavam tomando.
De início, a pretensão era encontrar uma criança com até dois anos de idade. Conforme a espera foi aumentando e o conhecimento sobre o tema também, a faixa etária de preferência foi subindo. "Nós fizemos cursos e neles eu falava que eu queria criança que frequentasse a escola, queria ajudar na tarefa, ir à apresentação da escola. Mas aí a assistente social perguntou por que eu tinha colocado que queria criança pequena", lembra.
Quando perceberam que não fazia diferença ter filhos com 6, 7, 8 anos de idade, Hellen e Rodrigo abriram caminho para o encontro com Letícia e Ana Júlia. Uma decisão que se confirmou acertada quando, em março, as duas aceitaram sair do abrigo em Caxambu (MG), onde passaram um ano, para a guarda provisória da família de Pouso Alegre.
Rodrigo, Letícia, Ana Júlia e Hellen na missão de serem felizes juntos em Pouso Alegre, MG, Dia das Mães (Foto: Daniela Ayres/ G1)Rodrigo, Letícia, Ana Júlia e Hellen na missão de serem felizes juntos em Pouso Alegre, MG
(Foto: Daniela Ayres/ G1)
Ranking da adoção
A felicidade vivida neste Dia das Mães por Flávia e Hellen só foi possível porque elas reviram a noção que tinham do papel de mãe. Com o passar do tempo, a alegria de ter um filho em casa superou o desejo de estar exclusivamente com um bebê. A maternidade ganhou outro significado.
"Se crianças precisam de amor e a gente tem tanto amor pra dar, por que se privar desse amor?", pergunta Flávia.
Segundo relatório do Cadastro Nacional de Adoção, 6.566 crianças e adolescentes estavam aptas para adoção em todo o Brasil até abril de 2016, dos quais 66,22% possuem irmãos. No entanto, das 35.588 pessoas cadastradas como pretendentes à adoção, apenas 30,3% aceitam adotar irmãos. Além disso, 37,96% escolhem o sexo do filho e 84,06% dos adotantes preferem crianças com até 5 anos de idade.
Ao adotar os irmãos, Kennedy e Oliver, Flávia descobriu que inúmeras crianças no Brasil estão na mesma situação (Foto: Daniela Ayres/ G1)Flávia adotou os irmãos Kennedy e Oliver; apenas 30,3% dos pretendentes aceitam adotar irmãos
(Foto: Daniela Ayres/ G1)
Pela lei de adoção em vigor desde 2009, tudo deve ser feito para que os vínculos familiares sejam mantidos entre irmãos. Elas devem ser adotadas em conjunto ou por famílias que residam na mesma cidade para facilitar o contato.
Segundo o balanço feito pela Corregedoria Nacional de Justiça em janeiro, que mantém o cadastro de adoção desde 2008, o número de pretendentes dispostos a adotar pelo menos duas crianças de uma mesma família subiu de 17% para 28% entre 2011 e 2016.
Invisível aos olhos
Indiferentes às estatísticas, a batalha de Ana Júlia e Letícia é não retornar a integrar os números de quem espera por um lar. Por estarem na guarda provisória, as irmãs ainda não podem ter documentos em nome da nova família. Mas, para orgulho de Hellen, elas não ligam para formalidades.
"O almoço da mamãe é muito gostoso", garante Letícia. "Eu gosto quando a mamãe faz a comida dela, o pudim", diz Ana Júlia.
Ana Júlia e Letícia comemoram primeiro Dia das Mães com a mãe Hellen, em Pouso Alegre, MG (Foto: Daniela Ayres/ G1)Ana Júlia e Letícia comemoram primeiro Dia das Mães com a mãe Hellen, em Pouso Alegre, MG
(Foto: Daniela Ayres/ G1)
E o carinho pela mãe de coração se repete em pequenos gestos espalhados pelo dia a dia da casa. Bilhetes com declarações chegam aos montes. No quarto, o cuidado em manter tudo organizado é uma marca das duas.
"'O essencial é invisível aos olhos', citando uma famosa passagem de O Pequeno Príncipe, de Antoine de Saint-Exupéry, Hellen resume a fase mãe. "A gente ainda escuta que nós somos doidos ou muito corajosos, como se fosse uma coisa de outro mundo. As pessoas estão olhando só o externo. É uma doação delas para nós. Não é nossa pra elas. Porque quem diz se vai ficar ou não são elas. A gente que foi adotado. A coragem é toda delas."